O que está de trás desta afirmação? É que, a sensivelmente dois meses atrás
havia decidido parar de cortar o cabelo e as repetitivas barbas. Entretanto, dentro
deste plano, escondia-se um objectivo único que era de ver a reação das pessoas
perante a nova imagem de um Dom Filipe embarbilhado e encabelado. Note-se que,
muito dos meus conhecidos tinham o hábito de me ver com cabelo curto e barba
tratada, para que depois, de uma forma inesperada verem-me de barba e cabelos cumpridos.
Agora, o que para mim foi mais surpreendente, é o resultado chocante que
tive dessa afronta.
Porque, é socialmente construído que o “homem tem que ter cabelo curto e
barba tratada”, Pude experimentar na pele e na espinha dorsal da alma o que é
que alguns homens têm sofrido por parte da sociedade quando são pressionados.
Quando digo “sociedade”, refiro-me especificamente meus amigos, família, irmãos
da igreja, colegas da escola, vizinhos entre os demais que vivem próximo de mim.
Há que saber ainda que a gente faz parte da mesma sociedade a que pertencemos.
Portanto, este é o nosso espaço de pertença. Entretanto, não somos sociedade se
estivermos dissociados dos outos.
Esta experiência acima de tudo deixou evidências claras de que a gente vive
uma grande actuação e a vida é um círculo onde cada um tenta actuar da melhor
forma possível de modo a angariar o maior número de elogios e desta forma
agradar aos seus espectadores.
A forma de atuação, dentre outras maneiras, consiste em falar como todos
falam, quando “se é homem”, tem que cortar-se o cabelo e nunca deixa-lo
crescer, acumular maior número de mulheres de modo agradar o universo
masculino, tem que consumir álcool, ser viril, ter dinheiro para bancar os outros,
ter sempre o domínio da situação e acima de tudo ser o centro de tudo (passe
repetição necessária) e de todos. O mundo tem que girar em torno das nossas
ideias e tudo que a mulher faz deve ser do nosso conhecimento, isto é, temos
que ser autoritários.
Certamente pôde compreender que a pressão começa mesmo dentro da nossa
família (casa ou lar), lembro de vezes sem conta os meus pais terem aconselhado
a cortar cabelo com a justificativa de que “estava a ficar com um mau aspecto e
parecia meio velhinho”. De seguida eram os meus colegas da academia que me
acusavam de sofrer de “síndrome de estudante”, sem esquecer também de alguns
colegas de trabalho que decidiram até não dizer nada em jeito de demostração da
insatisfação que nutriam, pois, desde a um tempo aconselhavam-me a cortar
cabelo e não os ouvia. Então o remedio era calar e ver até onde é que a loucura
levava.
Por outro lado, não tardou para que a minha parceira começasse a pressionar
para que cortasse cabelo, usando
o argumento de que não me conheceu com barba e que se no dia em que nos
conquistamos tivesse daquele aspecto, não teria aceitado a nossa relação por
nada deste mundo. “A única coisa que nos mantem juntos é a questão de que já
espreitei a sua alma e vi a pessoa especial que em ti vivi” dizia ela. Juro que
essa parte me deixou demasiadamente comovido. Ouvir tamanhas palavras da minha
amada, quase me convencia a cortar o cabelo. Mas também, doutro lado, o
objectivo era maior ainda. Gostaria ainda de experimentar aquela tensão, aquela
afronta perante um costume milenar que vive desde os primórdios da humanidade.
Lembro ainda, neste episódio de pressão. Certa vez, estava voltando de um
evento que promovemos no bairro da Polana Caniço ao nível do trabalho, num
programa chamado “Arte 100 Violência”, cruzei com Miro. Este que foi um amigo
da infância e ultimamente vive no bairro da CMC, mas que outrora terá vivido no
mesmo bairro que eu (Polana Caniço). Cruzamos juntos “ Ka Olga” (no Olga) que é
uma esquina onde muitos homens (jovens) da zona e de outros lugares
circunvizinhos se encontram para comer carne e gastar algum dinheiro, mas que
eu nesse dia não que tivesse recorrido a este sítio para comer carne, mas sim
para mi proteger da chuva que minguava do céu rasgado de nuvens de nuvens
negras sobre o Maputo. Mas também tem razão para tal. Não bebo, não fumo e nem
passo noites fora (escepto das vezes que quero ouvir o que eles comentam como
homens). Logo ao chegar no local referido, começou a tecer as suas críticas
“Sabe nem te fica bem. Tens que cortar isso, essa coisa de barba não é para ti.
Vão-te confundir com ladrão imagina se roubam num sítio? Vão logo indicar a ti”
dizia isto olhando fixamente nos olhos como se quisesse puxar a minha alma para
se separar da sua pele. Continuava o sermão “Tsema man” (corta homem).
Juro que experimentei vários sentimentos. Estes sentimentos, misturavam-se
dentro de mim como se fosse o fogo quando encontra o petróleo. Pensamentos de dúvidas
e incertezas orbitavam o cosmo dos meus sentidos, incendiando a minha alma.
Parecia que estava a sufocar dentro de um rio, sentia no coração um gelado de
palavras que entontavam a minha mente. Senti-me comigo em falta, mas com os
outros incompleto sem o “meu eu”.
Mas agora eu pergunto. Será que as pessoas não podem ser o que desejam ser?
Será que para ser pessoa (homem) tem que ser como o outro? Não podemos nos
recriar?
A meu ver, sou da opinião de que as pessoas devem ser livres de ser aquilo
que desejam ser, longe da pressão e dos estereótipos. A menos que, o que a
pessoa faz não mecha com a integridade do outro para mim esse individuo não
deve deixar de fazer o que tem feito por conta do que os outros falam ou dizem.
Nós somos livres de ser e de estar onde,
como e quando quiser. Ninguém deve nos impor regras.
Portanto, eu desafio a todos para que deixem-me ser do jeito como sou quero
ser. Se cortei barba é porque me sinto bem. Se deixei a barba crescer, foi
porque queria vos sufocar. Não sou menos ou mais homem que o outro, sou homem
na medida certa.
Perdoa-me aquele que incomodei, mas se também se incomodei é porque essa
pessoa não gosta de ver os outros livres a gozarem dos seus direitos. Por esta
razão, tiro a minha desculpa.
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